Tag: produção nacional

  • Severino, o Espetáculo

    Sempre tive o hábito de rotular o que assisto: é peça? Musical? Peça musicada? A produção no título se define “Severino – o Espetáculo”.

    Severino se propõe a fazer uma imersão em Morte e Vida Severina, o espetáculo parte da palavra escrita, mas não se limita a ela. Movimento e música entram em cena e transformam o texto em uma vivência rica e repleta de novas camadas.

    Figurino e visagismo estão inteligentes e bem construídos. Mesmo sem trocas de roupa, se adaptam com inteligência ao tom de cada cena.  Em uma paleta forte de vermelho traduzem bem o sofrimento e o sertão, mas carrega tons vivos que se encaixam bem nas cenas alegres.

    Tudo no palco parece ter um porquê. A coreografia segue uma linha contemporânea, com elementos da cultura brasileira. Em diversos momentos a história é contada mais pelo corpo do que pela voz. Movimento por vezes vira instrumento musical, sendo passadas e batidas parte integral da sonoplastia.

    Severino grita arte. É o perfeito exemplo da produção independente que se dispõe a criar algo único. Que mostra o que acontece quando você junta bons artistas e os dá espaço para criar…

    É uma ótima peça, um belo musical, uma boa apresentação de dança… Espetáculo realmente define.

    Uma produção que merece ser vista… Então corre!!

  • Cenas da Menopausa [peça]

    Um dos meus fenômenos favoritos da natureza é a sintonia entre Cláudia Raia, a direção de Jarbas Homem de Mello e o texto de Anna Toledo. Em Cenas da Menopausa o resultado é uma peça que trata de um tabu com leveza, verdade e bom humor.

    Alguns assuntos simplesmente não são falados. Quando vêm à tona, é comum que seja abrupto, incômodo, amargo. Cenas da Menopausa escolhe outra abordagem: trata o tema com humor, empatia e informação. Em vez do choque, oferece acolhimento. E cumpre essa missão com sensibilidade, inteligência e muitas risadas.

    É uma comédia musicada que aposta em um humor direto e acessível. O roteiro avança pelos diálogos, já as músicas – paródias de hits conhecidos – aprofundam contexto, geram conexão, e dão ritmo à narrativa.

    Não é uma narrativa linear, mas uma sequência de sketches que contam diferentes histórias. Alguns são curtos e diretos, outros se desenvolvem em cenas que se complementam. Cláudia Raia e Jarbas se multiplicam em papéis diversos, dando vida a várias experiências. Cada história reforça uma verdade importante: embora a fase seja comum, cada mulher vive a menopausa de um jeito único.

    O texto aborda de forma clara e honesta os efeitos da menopausa no corpo, na carreira, na autoestima, nos relacionamentos. Tudo é dito abertamente, baseado em fatos, sem espaço para meias-palavras. A produção de propõe a educar, uma verdadeira aula encapsulada em comédia.

    O visual acompanha bem essa proposta: cenário, figurinos e iluminação compõem uma estética cuidadosa e funcional, que serve à fluidez da história.

    Após a peça, há um momento de conexão profunda. O microfone desce para platéia para abrir espaço a histórias reais, posicionando uma troca verdadeira com o público.

    Pois bem, necessário!! Se não viu ainda, aproveita que estendeu a temporada e já corre.

    Matéria Sobre a Produção

  • Torto Arado

    Com sessões que esgotam no dia da abertura das vendas, Torto arado é um inegável sucesso. Adaptado do livro homônimo, é um excelente exemplo de produção nacional de qualidade. Mas não é pra todo mundo.

    O cenário e a iluminação são simples, mas funcionam bem dentro da proposta. Já o figurino chama atenção: mesmo ao retratar roupas humildes é interessante, bem construído e com clara atenção aos detalhes.

    O roteiro retrata a trajetória de duas irmãs negras no sertão brasileiro. A história mergulha em temas como ancestralidade, desigualdade social, opressão e resistência. É um roteiro denso, com momentos leves no início, mas que logo mergulha fundo nos conflitos e violências que os personagens enfrentam. A narrativa vai ganhando peso — e não dá muito espaço para o público respirar. É o tipo de espetáculo que te faz sair da sala com o estômago revirado, o que é coerente com a história que se propõe a contar.

    A qualidade do elenco impressiona. A atuação segura, somada ao trabalho vocal de qualidade, sustenta o peso da história. A produção emociona mais pela entrega do que por qualquer elemento técnico mais elaborado.

    Não é pra todo mundo, mas quem gostar da sinopse vai gostar muito da produção.

    PS: Não sei se é da produção ou do teatro, mas a temporada Sesc são 2h20 sem intervalo.

    Matéria Sobre a Produção

  • João

    João traz um alinhamento único de estrelas, resultando em uma experiência forte, visualmente bela, e curiosamente agradável.

    É uma experiência imersiva com um palco em formato arena (plateia nos 4 lados). O espaço é pequeno, mas cada centímetro é bem pensado e aproveitado com propósito.

    O que surpreende é como essa proposta imersiva vai além da proximidade física entre platéia e palco. João é diferente, é visualmente impactante. Luz, figurino e cenário trabalham juntos, de forma sincronizada, criando momentos bonitos e marcantes. Nada parece colocado por acaso — tudo tem intenção e sentido.

    Outro ponto que se destaca é a movimentação em cena. Não só o centro do “palco”, mas todos os espaços são ocupados — às vezes acima da plateia, às vezes surgindo por baixo ou pelas laterais. A movimentação é fluida e bem integrada aos outros elementos visuais. Mais do que um recurso estético, o movimento funciona como parte da narrativa, dando ritmo, transição e ajudando a construir as cenas com mais profundidade.

    O roteiro é interessante, mas não é pra todo mundo. Trata de temas como sexualidade, violência e marginalização. Por isso, vale a pena ler a sinopse antes de ir.

    Mesmo com temas densos, tem leveza. Há cenas engraçadas e respiros no meio da tensão. Isso equilibra a narrativa e ajuda a absorver a mensagem de forma mais natural, sem pesar demais.

    Em tendo oportunidade, vale a pena.

    PS: Músicas são ótimas!! Torcendo para lançarem no Spotify.

  • Vital, o Musical dos Paralamas

    Assistir ao musical Vital foi uma surpresa — no melhor sentido possível

    Preciso começar sendo sincera: musicais biográficos de músicos no geral não me agradam. Cheguei com expectativas baixas, saí encantada. Me surpreendeu em todos os aspectos, e pela primeira vez me vi cantando em um musical.

    Vital tem uma energia única. Entrega algo novo, mostrando novas camadas de uma história que parecia conhecida.

    A narrativa começa no momento em que Herbert Vianna recobra a consciência após o acidente que mudou sua vida. A partir daí, o primeiro ato nos leva por memórias da formação da banda, com uma mistura de alegria, leveza e uma vibração quase contagiante. Fala de amizade, amor e do início de uma carreira construída em conjunto.

    No segundo ato, o tom muda. O foco passa a ser a recuperação de Herbert e como os laços entre os integrantes foram fundamentais para a continuidade da banda. É mais intenso, mais denso. A abordagem é honesta, com foco na reconstrução e na esperança.

    Roteiro é bem construído, canções e texto se encaixam de forma fluída. Um adiciona contexto ao outro, e as canções enriquecem a narrativa.

    Cenário é simples, mas traz algo novo. Composto por duas grandes molduras que criam diferentes níveis de altura e profundidade no palco. A iluminação faz o resto do trabalho, transformando o espaço a cada cena, sem a necessidade de grandes trocas cênicas.

    E sim, tem aquele momento clássico em que convidam o público a cantar junto. Normalmente fico só observando… foi a primeira vez que me senti compelida a me juntar a cantoria.

    Vital traz algo novo, mesmo contando uma história que a gente já achava que conhecia. Uma bela homenagem a altura do legado do Paralamas do Sucesso.

    Entrevista com Elenco

  • Dom Casmurro

    Eu sempre tive um carinho especial por Dom Casmurro. Quando vi que a obra ia virar musical, confesso que fiquei em dúvida. Era uma mistura de medo – aquele receio de que pudessem distorcer uma história tão querida – com a curiosidade de ver como traduziriam a essência do livro em um musical.

    Dom Casmurro, o Musical é o tipo de espetáculo que mostra o que pode acontecer quando artistas talentosos se dedicam a criar algo único.

    O cenário é simples, mas bem pensado: um fundo que parece um papel de parede desgastado (ou uma capa de livro antigo), com cadeiras que dão o tom do ambiente. Mas o que realmente te faz mergulhar na história são o desenho de luz e a direção de movimento. É incrível como essas duas coisas, sem grandes efeitos ou pirotecnia, conseguem construir as cenas com tanta profundidade. A morte de Escobar, em especial, é representada com uma coreografia cheia de significado.

    O roteiro e as músicas acrescentam novas nuances à narrativa, preservando o que há de mais genuíno na obra original.É perceptível o cuidado que tiveram em manter a ambiguidade da obra original. A maneira como os personagens ganham vida é rica e bem construída, tudo feito com respeito à complexidade do romance.

    Quanto ao elenco, todos estão em sintonia. Cada ator entrega seu personagem com autenticidade, fazendo você enxergar as emoções deles de forma clara e envolvente. A mistura de romance, humor e drama flui naturalmente, tornando o espetáculo leve e prazeroso.

    Por último mas não menos importante: Dom Casmurro tem preços muito acessíveis. Não só é uma excelente opção, como também tem um ótimo custo-benefício. Só vai, e me agradece depois!!

    Matéria Sobre a Produção

  • O Palhaço tá Sem Graça

    O Palhaço Tá Sem Graça começa com um violino, o foco se abre, o circo toma forma. Uma movimentação bem coreografada, acrobacias, luzes amarrando uma cena que encanta visualmente.

    A produção tem diversas referências do Balão Mágico. Se você viveu essa fase, provavelmente vai sentir uma conexão afetiva especial — se não, pode ser que alguns detalhes passem batido (que foi o meu caso).

    O palhaço tá sem graça pode soar um título triste,  mas a produção em si não é. O circo funciona mais como metáfora: um espaço para pensar sobre as diferentes versões de nós mesmos. Sobre o quanto realmente conhecemos quem está ao nosso lado.

    É uma dessas histórias que aquece o coração. Aquela comédia de riso fácil que cria conexão instantânea com os protagonistas. Em contrapartida, tem seus momentos dramáticos que demonstram a complexidade dos personagens. Me parece uma produção que fala com os dois públicos: usa a nostalgia para envolver os adultos e mantém uma linguagem que também alcança as crianças. Se enquadra bem na definição de “pra toda família”.

    O enredo evolui mais pelo diálogo do que pelas canções. Algumas cenas podem parecer perder um pouco o ritmo, não pela cena em si, mas por ser um diálogo maior que vem logo após uma cena muito vibrante.

    Cenário me chamou atenção. Engenhoso, bonito e com cores e estilo que realmente enriquecem a produção. Eu fiquei encantada com as luzes que formam uma tenda sobre a platéia. É um cuidado de levar a produção pra platéia que é difícil de ver.

    Desenho de luz e figurino são muito bem construídos. Um ponto interessante é que o figurino consegue ser harmônico apesar da diferença de estilos e cores que cada personagem exige.

    Há cenas em que tudo isso se alinha de maneira especial, criando imagens visualmente marcantes.

    Pois bem, se você não tem medo de palhaços, vale a pena. É uma comédia sensível, tem graça, tem drama e tem coração. Vá com o olhar atento para os aspectos visuais, os detalhes vão te surpreender.

    PS: ~75 minutos com ingressos acessíveis (especialmente às sextas).

  • O Mágico di Ó

    O Mágico di Ó se destaca pelo seu texto envolvente, que explora o poder das palavras e homenageia o cordel. A produção é simples, mas bem executada, com uma direção impecável e um elenco talentoso.


    Boas produções sempre têm algo que chama a atenção—pode ser a complexidade vocal das canções, um cenário bem elaborado ou coreografias complexas. Em O Mágico di Ó, o grande destaque é o texto (ou livreto, ou a junção de letras e diálogos, como quiser chamar). Ele explora o poder das palavras e da linguagem, provocando emoções e divertindo. Ao mesmo tempo, faz uma bela homenagem ao cordel, esse belo pedaço da nossa cultura cultura tão rico quanto pouco lembrado.

    O Mágico di Ó é uma ótima opção para toda a família. Apesar de inspirado na história infantil, traz uma roupagem diferente que entretém as crianças e, ao mesmo tempo, oferece reflexões e diverte os adultos.

    O cenário, embora simples, cumpre bem seu papel, enquanto figurino e visagismo se destacam—sobretudo no uso da maquiagem que remete ao traço característico do cordel.

    A direção também merece menção: mesmo com recursos limitados de luz e um cenário enxuto, os artistas interpretam, cantam, movimentam elementos de cena e até tocam instrumentos, tudo de forma bem orquestrada e com propósito. É um trabalho que surpreende pela harmonia e pela forma como cada detalhe é pensado.

    Gostei tanto do texto que acabei levando o livro para casa. O elenco é incrível, a produção é simples, mas bem construída. Só vai e me agradece depois.

    Teaser da Produção

  • Memórias Póstumas de Brás Cubas

    Uma excelente oportunidade de redescobrir um clássico literário brasileiro de forma leve e dinâmica. Um monólogo bem construído, capaz de prender a atenção pela atuação dinâmica e criativa. O cenário minimalista, mas engenhoso, demonstra como criatividade não depende de grandes recursos. Uma experiência essencial para quem deseja mergulhar em um clássico brasileiro.


    Algumas experiências são necessárias, e Memórias Póstumas de Brás Cubas se encaixa nessa categoria. É uma excelente oportunidade para redescobrir esse clássico da nossa literatura sob um novo olhar. Vamos ser sinceros: nem sempre valorizamos esse tipo de obra como mereceria, mas esse espetáculo facilita bastante.

    É um monólogo, com todos os desafios que o modelo traz. É muito bem executado e dinâmico, com um ator que consegue ocupar bem o palco e, de vez em quando, caminha entre o público, aproximando ainda mais quem assiste da história.

    O cenário é simples e criativo: um banco em forma de caixão acompanhado de poucos elementos cênicos. O fundo merece destaque, pois traz uma pintura representando o Rio de Janeiro coberta por um tecido escuro, que fica mais ou menos visível dependendo da iluminação. É uma excelente demonstração de que qualidade não vem do complexo e caro, mas da habilidade do time criativo.

    O texto é fiel ao livro, porém com músicas especialmente compostas para a peça. Se você prestar atenção, conseguirá perceber uma diferença sutil entre o estilo da narrativa e as letras das canções – que, aliás, são bem escritas. Um ponto interessante é que, embora seja um musical, ele não possui tantas canções quanto você pode imaginar. Por um lado, fica uma sensação de que poderia ter um pouco mais de música; por outro, é bacana notar a preocupação em manter a fidelidade ao texto original.

    O espetáculo tem o tempo certo pra não chegar a ser cansativo, mas sei que monólogo não agrada todo mundo.

    A peça já teve várias temporadas ao longo dos anos, o que naturalmente comprova seu valor. Por outro lado, parece ter mudado pouco desde que começou (pelo menos pelo que dá para perceber nas fotos e vídeos mais antigos). Em meio a tantas novidades no teatro atual—com cenários elaborados e surpresas no palco—é bom saber de antemão que esta montagem segue um caminho mais simples e “tradicional”.

    De qualquer forma, é um espetáculo que merece ser visto, principalmente se você estiver aberto ao principal objetivo: apreciar uma adaptação criativa e bem realizada de um texto clássico da literatura brasileira.

  • Tom Jobim, Musical


    A produção encanta visualmente com um cenário que remete ao interior de um piano e silhuetas do Rio de Janeiro. O musical brilha pela integração cuidadosa do espírito da bossa nova em todos os detalhes do musical. Além disso, conta com uma coreografia fluida e figurinos bem construídos que adicionam dinamismo e contexto às cenas.

    Assistir Tom Jobim Musical é desfrutar de uma homenagem sincera e bem construída a um grande ícone da música brasileira.


    Fui assistir a Tom Jobim com um viés: queria muito gostar. É bom, mas não é “o que eu esperava”, e expectativa gera frustração. Ainda assim, recomendo a experiência… É uma excelente oportunidade de celebrar a história de um dos grandes nomes da música brasileira.

    Tom Jobim Musical mostra uma sofisticação discreta, criando uma atmosfera que verdadeiramente reflete a essência da bossa nova. A produção é visualmente atraente e tem vocais belíssimos, ou seja, no geral é uma experiência muito agradável.

    Coreografia está irretocável: interessante e bem executada. Sem mais.

    O figurino merece destaque pelo cuidado como retrata os personagens e atenção aos detalhes e contexto da época. Chama atenção especialmente o trabalho feito com o figurino do ensemble. Ele adiciona fluidez e movimento às cenas, enriquecendo visualmente toda a experiência do espetáculo.

    O Cenário é lindo. Ele possui estruturas de madeira que representam a parte interna do piano, enquanto criam a silhueta da cidade do Rio de Janeiro. Tem uma vírgula: um círculo branco que é usado em projeções de algumas cenas. Confesso que achei desnecessário. As projeções cortam a sutileza das cenas com imagens realistas que quebram a elegância e delicadeza da cena sem adicionar um contexto muito relevante.

    Montar um musical sobre músicos é um super desafio, já que as canções originais não foram feitas pensando em uma narrativa teatral. Integrar as músicas de Tom Jobim para contar sua história exige cuidado para respeitar o legado artístico e manter o ritmo narrativo. Dito isso, o roteiro não me envolveu completamente: o primeiro ato, embora bonito, é um pouco monótono. O segundo ato ganha ritmo e é bem mais interessante. Destaque especial para a cena do divórcio, muito bem construída e que mostra claramente como música e narrativa podem caminhar juntas para construir algo único.

    No fim, saí do teatro com a sensação de ter vivido uma experiência agradável. Não é a montagem mais impactante que já vi, mas tem muitos méritos e faz jus à grandiosidade de Tom Jobim.

    Recomendo. 😉

    Tom Jobim Teaser

    Cenografia de Tom Jobim Musical